O Brasil pode estar diante de uma nova revolução industrial. Essa foi a principal mensagem do Fórum Data Center Brasil – Economia, Regulação e Oportunidades, realizado nesta semana na sede da Fiesp, em São Paulo. Com um investimento projetado de mais de US$ 100 bilhões nos próximos anos, o país tenta consolidar-se como hub estratégico global de infraestrutura digital — e, para isso, aposta em uma política pública inédita e no seu maior diferencial: a energia limpa e abundante.
Segundo o assessor especial do Ministério da Fazenda, Igor Marquezine Ferreira, um dos principais problemas enfrentados hoje é o alto custo para importar e operar data centers no país. “Cerca de 60% da carga digital do Brasil é processada na Virgínia, nos Estados Unidos. Isso é um risco para a soberania digital e um contrassenso diante do nosso potencial energético”, afirmou. Entre os motivos está a complexidade tributária brasileira, que torna o país o mais caro do mundo para contratação de serviços digitais, superando até Japão e Bangladesh.
A resposta do governo vem com o Redata, política que antecipa os benefícios da reforma tributária de 2023 para o setor, desonerando o investimento em hardware e infraestrutura crítica, o chamado CAPEX de TI. Em troca, as empresas deverão atender exigências relacionadas a sustentabilidade, disponibilidade de capacidade ao mercado interno e investimento em pesquisa e desenvolvimento.

Energia limpa, sim. Água, quase nenhuma
Além da desoneração, o Brasil oferece vantagens naturais: uma das matrizes elétricas mais limpas do mundo, estabilidade geopolítica e ausência de desastres naturais. Já as preocupações ambientais — especialmente em relação ao consumo de água — foram duramente rebatidas durante o evento.
Estudo da Brascom indica que, mesmo com o crescimento previsto, os data centers devem consumir apenas 0,01% da água do país até 2030, graças ao uso de tecnologias de refrigeração em circuito fechado. Em termos de energia elétrica, o consumo atual representa cerca de 1,3% do total nacional e poderá subir para 5% sem comprometer o sistema.
“O consumo é irrisório perto de outros setores. O Brasil tem energia limpa e capacidade excedente — não estamos falando de um gargalo energético, mas de planejamento e conexão”, reforçou Afonso Nina, presidente da Brascom.
Reindustrialização e inovação
Outro ponto levantado no fórum foi o potencial do setor de data centers em reindustrializar o país, reaproveitando estruturas ociosas, como as instaladas em polos automobilísticos do passado. “Data center é infraestrutura. Não gera empregos como uma montadora, mas ativa todo um ecossistema digital e tecnológico”, pontuou Alessandro Lombardi, chairman da Elea Data Centers.
A cadeia de valor envolvida inclui desde a fabricação de geradores e sistemas de resfriamento até a operação de serviços de nuvem e inteligência artificial. O avanço dessa indústria pode estimular ainda a formação de mão de obra técnica e o surgimento de novos players no mercado nacional — incluindo startups de IA, um dos setores mais promissores do mundo atualmente.
Regulação na medida certa
No centro dos debates esteve ainda o Projeto de Lei 2338, que pretende regulamentar o uso da inteligência artificial no Brasil. Embora visto como um bom ponto de partida, o excesso de projetos legislativos paralelos e a falta de definição clara entre operadores de data centers e provedores de nuvem ainda geram insegurança para investidores estrangeiros.
“A insegurança não está tanto na regulação, mas na dúvida sobre qual será a regra”, observou Igor Ferreira. “A aprovação do marco legal pode reduzir ruídos e consolidar o Brasil como um país com segurança jurídica para inovação.”
A expectativa é de que o Redata seja oficialmente publicado ainda em 2025, abrindo caminho para uma nova etapa de expansão digital. Com as condições certas, o Brasil poderá atrair investimentos estratégicos, fomentar a competitividade e ganhar protagonismo global em tecnologias críticas como cloud computing e inteligência artificial.