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Internacionalização das TICs frente às novas políticas globais 

Artigo por  Dra. Evelin Priscila Trindade, pesquisadora do Think Tank da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES) 

A recente mudança nas políticas comerciais dos Estados Unidos (no ano de 2025) gera tensões que afetam diversos países, inclusive o Brasil. Contudo, para as empresas brasileiras de tecnologia, essas turbulências também são fonte de oportunidades estratégicas de internacionalização.  

A chave está em converter risco em vantagem competitiva, explorando espaços abertos pelo redesenho da geopolítica tecnológica e comercial internacional. 

Primeiramente, é importante entender o contexto. O governo norte-americano lançou investigações via a secção 301 da Lei de Comércio, inclusive contra o Brasil, por supostas práticas discriminatórias no setor digital — por exemplo o PIX utilizado para pagamentos instantâneos. Além disso, o Brasil enfrenta tarifas elevadas (como as anunciadas de até 50%) para produtos de exportação tradicionais. Finalmente, o país lançou sua própria iniciativa de indústria 4.0, digitalização e infraestrutura de nuvem/IA, o que fortalece a base interna para internacionalização de empresas americanas de TICs. 

Diante desse cenário, que oportunidades as empresas brasileiras de tecnologia teriam? Vou listar as três principais a seguir. 

  1. Diferenciação por proximidade e adaptabilidade à nova fragmentação global:  

Com a intensificação de uma guerra comercial e o foco dos EUA em “blocos” tecnológicos (alianças, fornecedores aprovados, restrições de exportação), há uma janela para empresas de tecnologia brasileiras explorarem mercados onde a dependência dos EUA ou de grandes players asiáticos é questionada. O Brasil, com fuso-horário próximo às Américas, língua portuguesa e crescente penetração digital, pode se posicionar como hub regional — tanto para América Latina como para servir operações de empresas globais que buscam diversificar riscos. Empresas brasileiras de software, fintechs, plataformas de serviços digitais podem ofertar soluções para o mercado latino-americano, aproveitando esse gap da desglobalização parcial ou pela reconfiguração de cadeias que os EUA estimulam. 

  1. Adoção de padrões elevados tecnológicos como vantagem competitiva:

As políticas tecnológicas LATAM exigem níveis de conformidade, segurança de dados, regulação digital — fatores em que as empresas brasileiras vêm evoluindo positivamente. Por exemplo, o Brasil lançou o Plano Nacional de IA arregimentando bilhões para inovação. Isso posiciona as empresas brasileiras para credenciar-se como fornecedores confiáveis em tecnologia para mercados emergentes onde confiança, idioma e adequação regulatória são diferenciais. Enquanto grandes players globais enfrentam desafios de regulação e reputação (como os impulsionados pela investigação dos EUA ao Brasil em serviços digitais), empresas brasileiras podem aproveitar para mostrar “menos risco geopolítico”, ou se posicionar como parceiros dos mercados latino-americanos. 

  1. Oportunidade de cooperação tecnológica no entorno das políticas tarifárias:

Apesar das tarifas norte-americanas atingirem principalmente os produtos físicos, o ambiente conflituoso de comércio pode impulsionar o interesse em fornecedores “alternativos” de tecnologia, para diversificar risco regulatório. Empresas brasileiras de tecnologia podem explorar modelos de parceria com empresas ou entidades dos EUA que desejam reduzir exposição direta ou atuar em rotas complementares. Isso abre caminho para internacionalização via joint-ventures, exportação de serviços (como SaaS, segurança cibernética, IoT) e mesmo atuação cross-border com raízes brasileiras. 

Claro que desafios existem: o mercado internacional requer escala, marcas fortes, acesso a capital e governança internacionalizada — pontos onde ainda muitas empresas brasileiras de tecnologia sofrem. Mas analisando friamente as mudanças nas políticas dos EUA é possível ver uma janela de oportunidade: 

  • Por um lado, a busca por fornecedores tecnológicos confiáveis fora dos grandes blocos (EUA-China) favorece quem conseguir se posicionar rapidamente. 
  • Por outro, o Brasil conta com um ecossistema em crescimento (fintechs, IA, cibersegurança) e com incentivos nacionais para digitalização e exportação de serviços. 
  • As tensões regulatórias internacionais podem gerar demanda por “alternativas” aos modelos tradicionais dos grandes players globais — um nicho em que empresas menores e ágeis podem brilhar. 

Concluindo, as políticas comerciais mais agressivas dos EUA iniciadas em 2025 — ainda que visem produtos físicos e geopolítica — afetam indiretamente o setor de tecnologia e criam mudanças que as empresas brasileiras podem transformar em vantagem. A chave está em adotar uma estratégia clara de internacionalização: explorando mercados latino-americanos, alavancando parcerias globais, fortalecendo conformidade regulatória e posicionando-se como fornecedor regional de confiança.  

 

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