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Tecnologia expõe vulnerabilidade no consumo de bebidas alcoólicas e revela brechas que favorecem fraudes com metanol

Uma pesquisa recém-divulgada pela Ipsos-Ipec mostra que, apesar do avanço de soluções digitais de rastreabilidade e segurança no mercado de bebidas, a maior parte dos consumidores brasileiros ainda não utiliza nenhum recurso tecnológico para verificar a procedência do que consome — e isso abre espaço para que adulterações com metanol sigam fazendo vítimas no país.

O levantamento, realizado com 2.000 pessoas em 132 municípios, aponta que 67% dos brasileiros afirmam estar preocupados ou muito preocupados com o risco de ingerir, mesmo sem saber, uma bebida adulterada com metanol. A preocupação, no entanto, contrasta com o comportamento de compra: entre aqueles que consomem bebida alcoólica (43% da amostra), 53% dizem raramente ou nunca checar informações básicas de autenticidade, como selo fiscal, QR Code, lacre ou proveniência. Outros 34% verificam sempre ou na maioria das vezes, enquanto 12% apenas ocasionalmente.

A quase totalidade dos entrevistados (94%) tomou conhecimento dos casos recentes de intoxicação por bebidas adulteradas — impulsionados pela viralização de conteúdos em redes sociais (52%) e pela cobertura da mídia tradicional (72%). Esse cenário elevou o alerta, mas não mudou completamente o comportamento: entre os consumidores de bebida alcoólica que souberam dos casos, 54% adotaram alguma medida de proteção, como suspender o consumo de destilados (17%) ou pausar temporariamente o consumo de álcool (14%). Ainda assim, 44% não alteraram seus hábitos, índice que sobe para 55% entre pessoas de 45 a 59 anos.

O dado que mais preocupa especialistas é que a cadeia de proteção disponível hoje — como selos digitais, QR Codes de rastreabilidade, sistemas antifraude e plataformas oficiais de verificação — ainda é pouco explorada pelo consumidor final, deixando uma brecha para adulterações de alto risco. Mesmo assim, os brasileiros atribuem a responsabilidade por evitar que bebidas adulteradas cheguem ao mercado principalmente aos órgãos fiscalizadores (41%), seguidos de perto pelos fabricantes (40%) e pelas distribuidoras (39%). Quando o assunto é a fonte mais confiável de informação, segurança pública, órgãos reguladores e Ministério da Saúde surgem empatados (13% cada), seguidos pela indústria (11%).

A falta de confiança se reflete em outro dado alarmante: metade da população não sabe sequer para qual órgão denunciar uma suspeita de adulteração. Entre os que sabem, a Polícia aparece em primeiro lugar (22%) e a Vigilância Sanitária em segundo (14%). A baixa familiaridade com canais oficiais e mecanismos digitais reforça, segundo especialistas, a necessidade de estratégias públicas que combinem fiscalização tecnológica, educação digital e comunicação ativa.

Para Márcia Cavallari, diretora da Ipsos-Ipec, o maior desafio está no descompasso entre risco e comportamento. “A pesquisa revela um amplo conhecimento sobre os casos de intoxicação, mas há um descompasso entre a preocupação de ingerir uma bebida adulterada com metanol e a baixa verificação da procedência no ponto de venda entre os consumidores. Existe espaço para campanhas de orientação prática, para reforço da fiscalização ao longo da cadeia e para a implementação de medidas que ajudem a garantir o consumo seguro”, afirma.

A conclusão da pesquisa reforça que, embora ferramentas tecnológicas para garantir autenticidade estejam disponíveis — de QR Codes verificáveis a plataformas que rastreiam lotes e certificações em tempo real — elas ainda não fazem parte da rotina do consumidor médio brasileiro. No momento em que adulterações com metanol seguem representando risco real, ampliar o uso dessas tecnologias e democratizar o acesso à informação pode ser o passo mais eficaz para evitar novos episódios de intoxicação e fortalecer a segurança no consumo de bebidas alcoólicas no país.

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