Saúde precária, insegurança crescente e orçamento no limite moldam a sensação de cansaço nacional. Metade da população rejeita o fim do home office e não vê mudanças na política — nem mesmo com episódios de grande repercussão. A percepção geral: tudo custa mais, tudo pesa mais e o país parece avançar pouco.
Uma pesquisa da Hibou, que ouviu 1.433 pessoas em todo o país, revela um Brasil emocionalmente exausto. Em um ano marcado por tensões políticas, clima instável e um mercado de trabalho em transição, o cotidiano se tornou mais duro para grande parte da população. A sensação predominante é de piora — especialmente em temas como segurança, saúde, custo de vida e rotina laboral.
Volta ao presencial vira símbolo de desgaste
Se antes o home office era visto como medida temporária, hoje ele virou pauta definitiva. Para 50% dos brasileiros, trabalhar mais presencialmente piora a qualidade de vida. A rejeição é ainda mais forte entre jovens de 16 a 34 anos (63%), que consideram o modelo tradicional um retrocesso em flexibilidade e bem-estar. Já entre adultos acima de 45 anos, cresce a percepção de que o presencial traz benefícios — revelando um choque geracional profundo sobre o futuro do trabalho.
Saúde e segurança: as maiores fontes de angústia
O atendimento de saúde é reprovado por 52% dos entrevistados, que relatam preços altos, espera longa e dificuldade de acesso. A segurança pública não fica atrás: 56% dizem que a situação piorou, e apenas 14% notam melhorias. A combinação desses fatores reforça a sensação de vulnerabilidade que permeia a vida cotidiana.
Política já não comove: prisão de Bolsonaro é vista como irrelevante
Um dado emblemático da pesquisa é o impacto quase nulo de eventos políticos sobre o humor da população. Para 49% dos brasileiros, a prisão de Jair Bolsonaro “não muda nada” na forma como enxergam o cenário nacional. Apenas 11% dizem que sua visão melhorou e 16% afirmam que piorou.
Segundo Lígia Mello, CSO da Hibou, o número revela saturação. “A população está exausta de crises repetidas. Episódios que antes eram capazes de movimentar a opinião pública hoje já não têm força para alterar percepções.”
Inflação oficial baixa, vida real cara
Embora indicadores econômicos sinalizem desaceleração da inflação, o bolso do brasileiro não sente alívio. 45% estão com contas atrasadas, e outros 35% pagam as despesas com dificuldade. Apenas 17% conseguem manter o orçamento em dia sem aperto.
A sensação de aumento generalizado de preços é quase unânime:
- 52% dizem que o supermercado ficou muito mais caro;
- 73% perceberam aumento significativo na conta de luz.
- O custo de vida pressiona, e a economia doméstica segue no limite.
Tecnologia: solução para uns, obstáculo para outros
A inteligência artificial, cada vez mais presente no cotidiano, divide opiniões. Para 47%, ela facilita a vida em algum nível. Para 18%, complica.
Entre jovens, o entusiasmo é maior — 24% dos entrevistados de 16 a 34 anos dizem que a IA facilita muito suas tarefas diárias. Já entre os mais velhos, cresce a parcela que não sabe avaliar seu impacto, evidenciando o abismo digital entre gerações.
A possível adoção de leis que restringem o reparo de eletrônicos fora da assistência autorizada também preocupa: 59% acreditam que isso encareceria consertos, enquanto 21% temem que isso aumente a necessidade de trocar aparelhos.
Crise climática: preocupação alta, confiança baixa
A crença de que eventos extremos são causados pelas mudanças climáticas é quase consensual: 88% concordam. Mas a confiança na efetividade da COP30 é mínima — só 18% esperam benefícios reais. Para 36%, nada mudará. E para 26%, a conferência pode até prejudicar a imagem do país.
O brasileiro vê o problema, mas não enxerga soluções vindo da política ou de grandes fóruns internacionais.
Um país cansado
O retrato geral da pesquisa é claro: 2025 consolidou um Brasil mais tenso, mais preocupado e mais fatigado. Entre insegurança pública, serviços básicos em piora, desgaste no ambiente de trabalho e um custo de vida que sobe mais rápido do que os índices oficiais, o brasileiro sente na prática o peso de um ano instável — e a perspectiva de melhora parece distante.









